Rótulos, Preconceitos, O Politicamente Correto e A Liberdade de Expressão

imagem: www.spiral3.biz

Deixemos de ser hipócritas: Podemos não ser um povo (ou país, ou estado) preconceituoso (racista, homofóbico, sexista, xenofóbico, etc.), mas temos pessoas preconceituosas, como em qualquer lugar do mundo. Seja este preconceito quanto a etnia, sexualidade, gênero, religião, etc. O preconceito é algo intrínseco ao ser humano pois trata-se da aceitação/rejeição/compreensão do desconhecido ou diferente. A reação adversa de uma pessoa "comum" ao ver duas pessoas do mesmo sexo se beijando é comparável à das tribos indígenas isoladas que se deparam com o homem "civilizado" ou então à de uma pessoa de cabelos compridos e barba grande (com uma trança no cavanhaque) entrando em um ônibus cheio. E isto não é questão de civilidade ou desenvolvimento, como apregoam alguns, caso contrário na Finlândia não existiriam casos registrados.

O preconceito é, ao mesmo tempo, psicológico (no que trata da autoafirmação e da inclusão no meio), sociológico (enquanto elemento de interação ou exclusão), cultural (por se tratar em algo inerente a determinada sociedade), educacional (principalmente pela transmissão de conceitos pela família ou pelo meio), estético (o conceito individual ou coletivo de beleza), ético (por se tratar da interação com outros indivíduos) e tantas outras nuances possíveis, mesmo que em maior ou menor escala. Esta é apenas uma constatação. Não cabe a mim, por não ser especialista em nenhuma destas áreas, analisar a fundo cada uma delas.

E ainda, quem nunca viu grupos que são (ou foram) alvo de preconceito serem preconceituosos com outros grupos? Judeus racistas, lésbicas que não se relacionam com bissexuais, etc. Na África do Sul, após o fim do Apartheid, ressaltou-se o racismo dos negros em relação aos brancos. Aliás, a própria escravidão de africanos só teve sucesso pois tribos rivais capturavam seus inimigos e os vendiam aos europeus - que só eram bem vindos por levarem "riqueza" a estas tribos. Isto sem considerar o fato de que a escravidão é muito mais antiga, praticada inclusive entre povos de mesma etnia (comum entre gregos, nórdicos, orientais, povos pré-colombianos, etc.)

Obviamente estas práticas deixaram de ser éticas em quase todas as culturas ditas civilizadas e, atualmente, tornou-se crime em inúmeros países - mas não todos. Entretanto, há exageros em casos isolados e negligência na maioria das situações. O próprio Bullying, tão em voga, é uma forma de preconceito. Os feios, os tímidos, os gordos, e tantos outros "tipos" de pessoas são alvos de preconceito em todos os níveis - inclusive no familiar. São situações diferentes do racismo, por exemplo? Nem tanto. São crimes? Não como a xenofobia ou a intolerância religiosa (a Lei 7716/89 em seu artigo 20 fala em "raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional", mas poderia ser bem mais ampla). Então estes preconceitos devem deixar de ser crime? Claro que não, mas talvez seja preciso estabelecer critérios bem mais claros para este tipo de julgamento e, quem sabe, criminalizar outras formas nocivas de preconceito e discriminação. Todos nós, com o mínimo de discernimento, sabemos do poder da mídia e sua capacidade de induzir a opinião pública. O que me preocupa é justamente a tendência da mídia em enfatizar determinados fatos isolados e se omitir na maioria deles. Pessoas MORREM todos os dias vítimas de racismo, homofobia, bullying, misoginia, etc. Mas quantos destes viram notícia?

Eu gosto muito de Filosofia Clássica. Gosto de Platão e Aristóteles e suas ideias sobre CategorizaçãoEntretanto, as interpretações equivocadas acabam levando não ao agrupamento por semelhanças, e sim à segregação pelas diferenças. Já na Filosofia Moderna, temos o exemplo de Michel Foucault, um crítico dos rótulos. Falando em Foucault, encontrei um texto muito interessante defendendo os rótulosA contrapartida ingrata de evitar uma classificação é justamente a Generalização, onde a simplificação demasiada pode levar à Discriminação.

Discriminar, no caso do preconceito, é tomar atitudes em relação a alguém por alguma característica sua. Novamente sou obrigado a discordar do genial Ariano Suassuna que disse: "A humanidade se divide em dois grupos: os que concordam comigo e os equivocados." Eu, pessoalmente, vejo as pessoas como indivíduos, e não como grupos - sejam eles étnicos, genéricos, culturais, ou qualquer outra subdivisão. Volto a usar um conceito pessoal, mas de base quase que anti-aristotélica, de que as classificações servem para agregar e não para segregar. Em outras palavras: em vez de separar as pessoas em grupos de características distintas, eu as reúno através de características iguais. Pode parecer meramente conceitual (como a antiga propaganda do Tostines) mas não é. Os indivíduos acabam por se distribuir em tantas classificações diferentes que reforçam o sentido de particularidade. Deixem-me citar um exemplo prático e lógico, usando apenas 10 pessoas e 3 características que são usualmente alvos de preconceito:

A, E, I, O, U são mulheres
B, C, D, F, G são homens

A e B se sentem atraídas somente com pessoas do mesmo sexo
C é casto (assexuado) por motivos religiosos
D e E se sentem atraídas com pessoas de ambos os sexos
F, G, I, O e U se sentem atraídas com pessoas do sexo oposto

A, B, C, D e E são descendentes de brancos
B, D, G, O e U são descendentes de negros
B, I e U são descendentes de indígenas
D, E, F e O são descendentes de orientais

Se cruzarmos os dados apenas destas 3 características listadas acima, teremos que:
A é mulher, homossexual, descendente de brancos e negros
B é homem, homossexual, descendente de brancos, negros e indígenas
C é homem, assexuado, descendente de brancos
D é homem, bissexual, descendente de brancos, negros e orientais
E é mulher, bissexual, descendente de orientais e brancos
F é homem, heterossexual, descendente de orientais
G é homem, heterossexual, descendente de negros
I é mulher, heterossexual, descendente de indígenas
O é mulher, heterossexual, descendente de orientais e negros
U é mulher, heterossexual, descendente de negros e indígenas

Todos com determinadas características em comum a outro(s) mas, individualmente, únicos no conjunto de características. E se tivéssemos mais pessoas, seria possível individualizá-las utilizando as mesmas características. Matematicamente falando, através da análise combinatória, seria possível superar toda a população mundial em combinações possíveis considerando-se apenas 10 características: 10^10 = 10 bilhões.


Deixem-me, enfim, mudar um pouco o rumo deste texto e discorrer rapidamente sobre a liberdade de expressão e o politicamente correto. Afinal de contas, é cansativo ficar se policiando sobre que palavras usar. Na minha opinião, todos tem o direito de ter e expressar a sua (opinião). O Reacionário tem tanto direito quanto o Libertário. Cabe a cada um concordar, discordar, e escolher (ou não) o seu lado. O preconceituoso não vai conseguir se livrar facilmente de seus preconceitos, então, a única possibilidade é ele não ter AÇÕES preconceituosas e discriminatórias. Mesmo com preconceito, é necessário que exista o RESPEITO. O racista pode sê-lo desde que não hostilize os indivíduos da raça contra a qual ele tem preconceito. Assim como o homofóbico, o sexista, o elitista, etc. Não é possível extinguir o preconceito, devemos combater a discriminação.

E a nós, enquanto alvos de preconceito - porque todos somos, em algum momento ou nível - cabe uma atitude muito simples: RESPEITAR O DESRESPEITO ALHEIO. Que não significa resignar-se e baixar a cabeça, mas tampouco confrontar e entrar em conflito. É colocar-se acima disto e fazer com que a evolução se dê uma pessoa de cada vez: em nós mesmos.



Leiam mais e, por favor, não se contentem somente com os links indicados abaixo. Façam suas próprias pesquisas e tirem suas próprias conclusões:

http://direito.folha.uol.com.br/blog/preconceito

http://direito.folha.uol.com.br/blog/category/racismo

http://direito.folha.uol.com.br/blog/category/discriminacaoec9e5bd088

http://www.uc.pt/fluc/dfci/publicacoes/modernidade_

http://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/liberdade-de-expressao-ou-discurso-de-odio-2280.html

http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/communication-and-information/freedom-of-expression/

http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-07122009-124122/publico/JULIO_CESAR_C_B_SILVA.pdf

http://portal100fronteiras.com.br/liberdade_ver.php?id=35

http://culti-e-popi.blogspot.com.br/2014/03/porque-comparar-negros-macacos-nao-e.html

http://super.abril.com.br/blogs/crash/somos-todos-mutantes/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Categoriza%C3%A7%C3%A3o

http://www.elivieira.com/2007/12/foucault-e-os-rtulos.html

http://rolim.com.br/2006/index.php?option=com_content&task=view&id=905&Itemid=3

http://www.cienciasecognicao.org/revista/index.php/cec/article/viewFile/80/74

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