Inteligências Múltiplas

Eu adoro meus filhos! E não só pelos motivos óbvios, mas também pela quantidade de questionamentos (e consequentemente ensinamentos) que eles apresentam quase que diariamente. Sim! Eu gosto quando eles me fazem perguntas! E gosto ainda mais quando eles param para escutar minhas respostas que - invariavelmente - acabam gerando mais perguntas do que uma definição sobre a dúvida. E é assim que eu acredito que seja construído o pensamento humano: dúvidas e respostas quer geram diferentes dúvidas.

Hoje, no caminho da casa da avó onde meu filho tem passado as férias enquanto eu trabalho, surgiu uma velha questão: a burrice. Ele, na ingenuidade ácida de qualquer criança, afirmou: "Fulano é um burro!". Dei um leve safanão de brincadeira e interpelei: "Não existe pessoa burra!". Um dos maiores problemas das crianças é que elas acreditam no que os adultos falam, por isso ele retrucou: "Mas a Beltrana sempre diz que ele é burro!". Então, mais uma vez, tive que apelar para uma resposta fundamentada. Esta é a minha maneira de explicar meu ponto de vista a uma criança de 8 anos que confia plenamente em mim e me tem como exemplo:

"Tu é bom em matemática, não é?"
"Sou..."
"E tu sabe ler e escrever bem, não é?"
"É..."
"Mas tu não é bom em futebol."
"Não. Nem tu!"
"Exatamente! Eu também não sou bom em futebol. Sempre fui melhor em vôlei e natação."
"Eu também"
"Deve ser por tu ser meu filho"
"É... Teus 50%."
"Isso. Mas tu tem colegas que são bons em futebol."
"Claro. Tem o Beltrano e o Sicrano."
"Ótimo. E o Beltrano é bom em matemática?"
"Não. Mas o Sicrano é."
"Então o Beltrano sabe ler e escrever bem?"
"Também não. Ele é bom só em futebol, em artesanato, dançar e fazer letra de Funk e de RAP."
"Ele faz RAP?"
"Faz... todos dizem que ele é bom nisso."
"E alguns dizem que ele é burro por não ser bom em matemática, ler e escrever?"
"Dizem..."
"Mas ele faz letra de RAP. É quase como escrever. É até mais difícil pra mim, por exemplo."
"Pra mim também..."
"E tu acha ele e o Sicrano burros?"
"Sei lá..."
"Olha só... antigamente, quando eu era criança, as pessoas tinham o costume de 'medir' inteligência através de alguns testes. Era um monte de perguntas que as pessoas tinham que responder sobre alguns assuntos. Normalmente eram assuntos envolvendo matemática ou lógica. Lembra o que é lógica, né?"
"Lembro..."
"Então. As pessoas faziam estes testes e tinham um resultado que era um número, chamado de Q.I. ou Quociente de Inteligência. Quanto mais alto fosse o Q.I. mais inteligente a pessoa seria."
"E tu fez esse teste?"
"Fiz mais de um, porque tinha vários testes diferentes."
"E qual foi o número do teu Q.I.?"
"Nem lembro..."
"Por que?"
"Não é importante."
"Como não?"
"É exatamente o que eu estou querendo te explicar. Não se pode 'medir' inteligência. Não se pode dizer que tu é mais inteligente que o Fulano, o Beltrano ou o Sicrano. São inteligências diferentes. São pessoas diferentes. Entendeu?"
"Não sei se eu entendi."
"Diz pra mim o que tu entendeu."
"Eu e o Sicrano somos inteligentes pra matemática. Eu sou inteligente também pra ler e escrever, mas não sou inteligente pra futebol. O Beltrano e o Sicrano são. E o Beltrano também é inteligente pra fazer RAP."
"E o Fulano, que a Beltrana diz que é burro, tu não consegue ver inteligência nele em algumas coisas?"
"Ele inventa histórias. E sabe muito sobre animais e jogos de video-game."
"Ele tem uma boa memória pra nomes dos animais e dos personagens?"
"É... E também sobre o que fazer nos jogos."
"Então... Será que um burro conseguiria ter boa memória?"
"Acho que não."
"Pois então... eu acho que tu entendeu."
"Quer dizer que cada um de nós é inteligente pra um tipo de coisa..."
"E, como no teu caso e do Sicrano, os dois são inteligentes pra uma coisa em comum..."
"A matemática!"
"A matemática..."
"E ninguém é burro!"
"Ninguém..."
"Vou dizer pra Beltrana que ela está errada!"
"Acho melhor não."
"Por quê?"
"Ela tem essa visão antiga. Se tu falar pra ela simplesmente que ela está errada não vai ajudar ela a entender. Tu pode tentar fazer ela entender essa visão de inteligência chamada de Inteligências Múltiplas, mas nunca dizer simplesmente que ela está errada."
"Porque ela pode se ofender?"
"Não necessariamente... mas pode sim... aí tu não vai conseguir fazer ela entender teu ponto de vista."
"Tá bom... Se ela falar de novo que o Fulano é burro eu vou explicar do jeito que eu entendi."
"Ótimo! Como é bom ter filhos inteligentes."
"Mas todos somos inteligentes, pai! Ninguém é burro!"
"É... Tu aprende rápido... algumas coisas..."
"Sim... E tem outras crianças que aprendem rápido outras coisas..."
"Isso aí! Chegamos! Te amo, filhote!"
"Também te amo, pai!"

Me lembro de Aristóteles nestas horas. Gosto de ser peripatético.

Sugiro um site para saber mais sobre o assunto:
http://www.inteligenciasmultiplas.com.br/.
Neste site há, inclusive, um teste (adequadamente chamado de inventário) para se fazer.

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